domingo, 23 de março de 2008

Cap.3 | Audição

Uma música que tocou na cena mais emocionante de um filme, o som do salto da sua mãe que se aproxima pelo corredor, a voz de um amigo – são alguns de milhares de exemplos de tipos de sons que podem desencadear uma enxurrada de memórias e emoções em nosso corpo.

Sons e melodias carregam em si um grande poder sobre a nossa mente, e estimulam a liberação de endorfina pelo organismo, atuando sobre poderosos centros de prazer do cérebro. É sobre como funciona esse sentido que falarei agora.

“Audição é o sentido de percepção do som e é resultado de pequenas fibras capilares no ouvido que detectam o movimento de uma membrana que vibra em resposta a mudanças na pressão exercidas por partículas atmosféricas entre uma escala de 9 a 22.000 Hz, no entanto isso varia em cada indivíduo. Som pode também ser detectado como vibrações conduzidas pelo corpo por tato. Freqüências mais baixas ou mais altas podem ser ouvidas após e somente dessa maneira”. Texto retirado do site Wikipedia.

Assim como na visão a percepção completa da imagem ocorre com a imagem enviada pelos dois olhos, na audição o processo chamado fusão binaural ocorre no cérebro, colhendo as mais sutis diferenças sonoras que chegam em cada ouvido, nos permitindo ter a informação unificada de som e apontando de onde ele vem.


Outras informações importantes sobre a audição:

- Junto ao ouvido humano existe uma estrutura chamada aparelho vestibular, que não é responsável pela audição, mas pelo equilíbrio.

- Há apenas 16 mil células capilares em uma cóclea humana, comparadas com 100 milhões fotoreceptores na retina dos olhos, e elas são extremamente vulneráveis.

- As pessoas tendem a perderem 40% de suas células capilares quando próximos aos 65 anos. E uma vez destruídas, essas células não regeneram.

- Abaixo segue uma relação dos diferentes níveis de surdez:

1 - Leve: nível auditivo de 25 a 40 decibéis, o que equivale a perda de até 25% da capacidade de ouvir e entender. A pessoa consegue participar de uma conversa, mas tem dificuldades para ouvir sussurros.

2 - Moderada: de 41 a 70 decibéis. Perda pode chegar a 70%. Não se consegue escutar os barulhos provocados pela movimentação em um escritório, por exemplo.

3 - Severa: de 71 a 90 decibéis. No limite, há praticamente perda total na capacidade de comunicação. Não é possível manter uma conversa em tom normal (60 decibéis). A audição só ocorre quando se grita perto do interlocutor.

4 - Profunda: acima de 90 decibéis. A pessoa só ouve ruídos como os de uma britadeira (120 a 130 decibéis).


Se feito corretamente, o estímulo auditivo em projetos de design pode não só ocupar os consumidores, como também transmitir sensações, mas, apesar de termos consciência disso, não tiramos proveito dessa ferramenta com tanta freqüência.

É bem verdade que não é em qualquer projeto que um projeto sonoro será viável ou terá sentido. Na maioria das vezes a música é usada em projetos de ambientes, sites, venda de CDs e DVDs, etc., mas ser usado com freqüência não quer dizer necessariamente ser eficiente.

Tive recentemente uma experiência em uma loja de departamentos que marcou não só a mim, como às pessoas que estavam presentes comigo nesse lugar. Estávamos em busca de produtos pela loja e se não fosse por isso já teríamos saído de lá sem titubear. O repertório musical era oriundo de um DVD de show que estava a venda e nele a platéia gritava, o cantor gritava, o som estava alto demais e a atmosfera criada nesse lugar era extremamente estressante. O estímulo sonoro não favoreceu o bem estar dos clientes e evitamos a qualquer custo voltar naquela loja, a não ser que fosse realmente necessário e rápido.

Em oposição a esse caso, tenho como exemplo uma vez em que estive no aeroporto.
Enquanto aguardava a chegada de um vôo, vagava pela área de desembarque, que não estava lá no seu período muito movimentado, e estava com uma sensação esquisita. O ambiente parecia triste, abandonado. Muito diferente da imagem que eu tinha de aeroporto quando eu era criança, em que eu tinha prazer de freqüentar e brincava com as portas automáticas.
Pensei um pouco e cheguei à seguinte conclusão: esse aeroporto precisa de música.

Depois que muitas companhias aéreas pararam de funcionar, algumas áreas do aeroporto ficaram vazias e como fizeram nas estações de metrô, o uso de música ambiente preencheria aquele espaço de maneira muito eficiente.

E se o aeroporto é um meio de convergência de culturas e às vezes o único lugar brasileiro visitado por estrangeiros, por que não usar a música ambiente para dar um aperitivo cultural da nossa gente, agregando funcionalidade e propósito ao projeto?

Esses exemplos servem para reforçar a idéia de que o som pode ser mais poderoso (em alguns casos até decisivo) do que pensamos na hora da escolha do público. Temas musicais são responsáveis por um aumento considerável no volume de compra de um produto e essa técnica pode ser aplicada de várias maneiras. Ou vocês acham que é qualquer um que tem a idéia de colocar dispositivos sonoros em bichos de pelúcia?

A boa notícia é que designers hoje em dia estão cada vez mais conscientes da importância de explorar esses sons em prol de uma boa experiência para o usuário e estão explorando o assunto de maneira muito criativa e com um misto de empirismo e conteúdo.

Participei de uma oficina criada por alunos da faculdade de Desenho Industrial de Bauru em que eles divulgam pelos encontros de estudantes métodos de seleção de sons no ambiente, várias referências de músicas experimentais, além de trazerem uma bagagem histórica da criação musical para embasar os seus argumentos.

Essas iniciativas são muito importantes para dar conhecimento para que comecemos a explorar esse mundo sonoro em nosso benefício e do mercado também.

Empresas como Sonicsista focam no trabalho de sonorização da marca, unindo personalidade e coesão com todo o projeto de identidade da marca. Esse trabalho engloba websounds, jogos e até música de espera em chamadas telefônicas.

Há diversos sites que fornecem arquivos de “samples” de instrumentos, loops de ritmos musicais separados por tema, que servem de matéria-prima para a criação da nossa própria melodia. Além disso, os aparelhos de mp3 hoje em dia têm a função de gravador que facilita muito a digitalização de sons ambientes que, com a ajuda de softwares e muita criatividade, nos permitem mergulhar na elaboração de projetos sonoros.

Voltando para o aspecto cultural da percepção dos estímulos, torna-se muito difícil ser preciso na hora de elencar qual o som mais apropriado para cada tipo de público, já que cada povo tem a sua cultura musical, com personalidade em suas nuances, mas, de uma maneira geral, estudos indicam através da análise de tempo, freqüência e amplitude a conexão de determinados sons e certos estados emocionais. É o que mostra o quadro abaixo, um estudo feito por Scherer e Oshinsky (1977):

Tempo
Lento – tristeza, tédio, desgosto;
Rápido – atividade, surpresa, felicidade, bem-estar, potência, medo, raiva.

Freqüência
Baixa – tédio, bem-estar, tristeza;
Alta – surpresa, potência, raiva, medo, atividade.

Amplitude
Pequena – desgosto, raiva, medo, tédio;
Grande – felicidade, bem-estar, atividade, surpresa.


Mas o design sonoro vai além de música ambiente. O projeto de sons de navegação, de transição, mouseover em sites ou mesmo o som do material de que é feito um produto são detalhes que enriquecem um layout. Em um site, por exemplo, eles são menos cansativos que a música de fundo, criam conexão com a ação do usuário e tornam o produto muito mais real e palpável.

Atentem ao termo “detalhe”, pois ele faz toda a diferença. Como para qualquer outra coisa, o excesso de sons pode confundir o usuário e provocar um caos, prejudicial em qualquer projeto. Atualmente, as pessoas procuram um pouco de tranqüilidade no meio da correria que nossa vida diária se tornou e, nesse caso, menos pode ser mais.

O uso de som enriquece qualquer tipo de mídia. Sem ela, filmes, novelas, reportagens, vinhetas, lojas, não transmitiriam a mesma emoção, pois a melodia tem o poder de ser rapidamente absorvida por qualquer pessoa que entre em contato com ela.

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